A Impenhorabilidade do Bem de Família na Locação: Análise da Súmula 486 do STJ
- Thais Marachini
- 22 de out.
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ResumoO presente artigo analisa o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) na Súmula 486, que reconhece a impenhorabilidade do único imóvel residencial do devedor mesmo quando locado a terceiros, desde que a renda obtida seja destinada à subsistência ou moradia da família. Examina-se os fundamentos jurídicos, a evolução jurisprudencial e os impactos práticos desta orientação.
Palavras-chave: Bem de Família, Impenhorabilidade, STJ, Locação, Função Social
1. Introdução
A proteção do bem de família, instituto previsto no artigo 1.711 do Código Civil, sempre representou importante mecanismo de garantia do direito fundamental à moradia. Contudo, uma questão tormentosa surgia quando o único imóvel do devedor encontrava-se locado a terceiros. A Súmula 486 do STJ veio pacificar esta controvérsia, estabelecendo parâmetros claros para a manutenção da impenhorabilidade nestes casos.
2. O Caso Concreto e a Evolução Jurisprudencial
A Súmula 486 consolida entendimento firmado em diversos precedentes do STJ, especialmente os Recursos Especiais que tratavam da matéria. O Tribunal, ao analisar casos concretos, percebeu a necessidade de adaptar a interpretação do instituto às realidades socioeconômicas contemporâneas.
O relator do leading case que embasou a súmula destacou que "a destinação do imóvel à moradia da família não se opera apenas pela efetiva ocupação, mas também pela utilização dos recursos dele advindos para garantir o sustento e a habitação do núcleo familiar"
3. Fundamentação Jurídica da Súmula 486
3.1. A Função Social da Propriedade
A decisão do STJ está alinhada com o princípio constitucional da função social da propriedade (art. 5º, XXIII da CF). Quando a renda da locação é revertida para a subsistência familiar, o imóvel cumpre sua função social, ainda que indiretamente.
3.2. Finalidade Protetiva do Bem de Família
Como explicou o Ministro Luis Felipe Salomão: "O bem de família não protege apenas as quatro paredes do imóvel, mas sim o projeto de vida e a dignidade da família que dele depende para seu sustento"
3.3. Dupla Hipótese de Manutenção da ProteçãoA súmula estabelece duas situações que mantêm a impenhorabilidade:a) Quando a renda é destinada à subsistência da família;b) Quando a renda é utilizada para custear outra moradia para a família.
4. Requisitos para Aplicação da Súmula
Para que o imóvel locado mantenha a proteção, devem ser observados os seguintes requisitos cumulativos:
4.1. Tratar-se do único imóvel residencial do devedor;
4.2. Existência de contrato de locação regular;
4.3. Comprovação de que os recursos são efetivamente destinados à subsistência familiar ou ao custeio de outra moradia;
4.4. Manutenção do caráter residencial do imóvel.
5. Impactos Práticos e Aplicação Judicial
5.1. Ônus da Prova Cabrá ao devedor comprovar o atendimento aos requisitos da súmula, especialmente o destino dado aos valores da locação. A documentação pode incluir extratos bancários, contratos de aluguel e comprovantes de despesas familiares.
5.2. Limites da Proteção A proteção não é absoluta. Permanecem válidas as exceções como débitos de condomínio, tributos sobre o imóvel e créditos trabalhistas.
6. Análise Crítica
6.1. Avanço na Proteção Social A súmula representa significativo avanço na proteção das famílias brasileiras, reconhecendo que as formas de organização familiar e sustento evoluíram. Muitas famílias dependem da renda de aluguéis para sua subsistência, especialmente idosos e aposentados.
6.2. Segurança Jurídica A pacificação da matéria traz maior previsibilidade tanto para devedores quanto para credores, reduzindo a litigiosidade e os custos processuais.
7. Conclusão
A Súmula 486 do STJ representa a adequação do instituto do bem de família às complexidades da vida contemporânea. Ao reconhecer que a proteção da moradia familiar pode se dar tanto pela ocupação direta quanto pela destinação econômica dos recursos à subsistência, o Tribunal demonstra sensibilidade social e compromisso com a efetividade dos direitos fundamentais.
A orientação consolida entendimento humanista que privilegia a dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade, garantindo que famílias não sejam desamparadas em situações onde a renda do único imóvel constitui seu principal meio de sustento.









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